Estava deitado em minha
cama.
Com uma garrafa de
Bourbon ao lado.
Cobertores espalhados no
chão.
Trago aqui e aqui, já
estava meio bêbado.
O quarto tava que era só
fumaça, tudo meio cinzento.
Inclusive minha vida.
Rotina desprezível.
A campainha toca, merda.
São onze da manhã, me
deixe em paz.
Estava sozinho, decidi
não abrir a porta.
“Tomara que ache que
morri”, pensei comigo.
Outro trago, desce
cortando.
Quem é que bebe Bourbon
às onze da manhã?
Campainha toca de novo.
Era insistente.
Levantei de mal grado,
vesti as calças.
Abri a porta com cara de
merda e lá estava ela.
“Finalmente, meu amor.
Trouxe almoço”.
Partiu meu coração,
amoleci feito misto quente.
Essa mulher chegou com o
diabo no corpo. Fazendo mudanças.
“Vou guardar essa garrafa
de Bourbon, Gui, já deu já”.
Não, não o Bourbon.
Então eu me sentei à
beira da cama. Acendi um cigarro.
Não é que veio e tirou o
cigarro na minha boca.
Desmoralizado dentro do
meu próprio apartamento.
“Cigarros mais fracos,
Gui, só os mais fracos”.
“Tudo bem”, respondi.
Abriu as janelas, dobrou
as cobertas, lavou minhas cuecas.
O sol estava queimando
meus olhos. Precisei dos óculos escuros.
De calça, sem camisa, e
óculos escuros.
“Vá tomar um banho rápido
enquanto eu arrumo a mesa, meu bem”.
Não, banho não. Mas eu fui,
antes que causasse problemas.
Peguei um cigarro
escondido e fumei durante o banho.
Sou um criminoso. Meu
crime é inafiançável.
Saí do banho, demorei um
pouco pra arrumar os cabelos.
Estava asseado, e não era
nem meio dia.
A porra das onze da
manhã. Ou um pouco depois disso.
Mesa preparada, era hora
de atacar.
Lavar as mãos antes. É
claro.
Comi feito um sem teto em
dia de almoço comunitário.
Pobre dos sem tetos,
deviam almoçar mais.
Caí no sofá.
Não, não, não.
“Lave a louça, meu bem,
por favor”.
O que essa mulher tem na
cabeça?
Caí no sofá de novo.
Louças devidamente lavadas.
Era um vencedor.
Comecei a cochilar, como
quem não quer nada.
Um peso de mais ou menos
50kg cai sobre mim.
“Hora do filminho”.
“Só se você me deixar
tomar outro trago daquele Bourbon”.
“Não, e não discuta,
vamos ver um filme”.
Filme então seria.
Hollywoodiano e
blockbuster. Meu Deus por quê?
Tava rolando uns
chamegos, umas mordidas acolá.
Gosto bastante disso. E
se gosto.
Saí comprar cigarros mais
fracos, Marlboro cinza.
É fraco mesmo. Desgraça
de cigarrinho do diabo.
Apartamento, minha cama,
caí por lá mesmo.
Bem de mansinho, como
quem não quer nada.
“Me ame”.
“Eu te amo” respondi.
“Você tá meio perdido na
vida, Gui”.
Pensei.
“Tô perdido sim, mas em
você, fico meio sem saber o que fazer.”
“Me ame”.
“Já disse que te amo.
Agora vem deitar comigo”.
Ela acordou antes de mim
e fez questão de me acordar.
Abri os olhos
forçadamente, sorri.
“Você é um lindo”.
Pensei.
“Você me ama, não é?”.
“Muito”. Um sorriso
arrebatador.
Pensei mais uma vez.
“Faz um favor?”.
“O que você quiser”.
Dissimulada de responder
isso.
“Tem como você trazer um
trago daquele Bourbon pra mim?”.
Levei na cara.
Tá se dando liberdade a
fazer essas coisas desde dias atrás.